Powered By Blogger

sexta-feira, 9 de julho de 2010



“Olhe nos meus olhos, rapaz!"
Não posso dizer quantas vezes ouvi essa frase agressiva e dolorosa. Tudo começou quando entrei no primeiro grau. Ouvi esse comando de pais, parentes, professores, diretores e de todo o tipo de pessoas. Ouvi tantas vezes que estranhava quando ninguém a proferia.
Às vezes, a frase vinha pontuada por uma reguada desferida pelo professor. Ele diria, "Olhe para mim quando eu estou falando com você!" Eu me contorceria e continuaria a olhar para o chão, o que o tornaria mais furioso. Eu daria uma rápida espiada em sua face hostil, me contorceria ainda mais, desconfortável naquela situação e incapaz de concatenar as palavras, e rapidamente desviaria o olhar.
Meu pai diria, "Olhe para mim! O que você está escondendo?"
"Nada."
Se o meu pai tivesse bebido, teria interpretado o "nada" como uma resposta malcriada e teria ido atrás de mim. Nessa época, meu pai comprava garrafões de vinho e bebia toda noite, antes e depois de eu ter ido para a cama.
Ele diria, "Olhe para mim!" e eu ficaria contemplando a escultura abstrata de garrafas vazias empilhadas atrás da cadeira e debaixo da mesa. Eu olharia qualquer coisa, menos ele. Quando eu era menor, costumava fugir enquanto ele me perseguia, sacudindo seu cinto, e minha mãe às vezes me salvava, outras vezes, não. Quando, aos doze anos, cresci e fiquei mais forte, dono de uma enorme coleção de canivetes, meu pai percebeu que seria perigoso prosseguir com essa história de "Olhe para mim!" seguida de uma cintada.
Todo mundo achava que entendia meu comportamento. Era simples: eu não era boa coisa.
"Ninguém confia num cara que não olha você nos olhos."
"Você tem jeito de marginal."
"Você está aprontando alguma. Eu tenho certeza!"
Eu não conseguia entender porque eles ficavam tão agitados, nem ao menos porque era tão importante olhar nos olhos dos outros. A vergonha me dominava, porque eu sabia o que as pessoas esperavam que eu fizesse e, mesmo assim, eu não fazia. O que havia de errado comigo?
"Sociopata" e "psicótico" eram dois dos mais comuns diagnósticos para meu comportamento: "Eu li sobre pessoas como você. Elas não têm expressão porque não têm sentimentos. Os piores assassinos da história eram sociopatas."
Passei a acreditar no que as pessoas diziam, porque eram tantos a falar a mesma coisa que devia ser verdade, e a compreensão de que eu era "defeituoso" realmente machucou. Tornei-me ainda mais tímido e introvertido, e comecei a ler sobre pessoas com desvio de personalidade... Será que eu cresceria como um assassino serial? Tinha lido que eles eram sorrateiros e não olhavam as pessoas nos olhos.
Eu meditei sobre isso durante muito tempo. Eu não agredia as pessoas. Não tacava fogo nas coisas. Não maltratava os animais. Não tinha vontade de matar ninguém. Mas... Talvez isso começasse mais tarde. Será que eu seria preso, um dia? Li sobre as prisões e concluí que as federais eram as melhores. Se eu tivesse que ser encarcerado, que fosse numa prisão federal, não em uma estadual corrupta como Attica.
Só na minha adolescência compreendi que eu não seria nada daquilo e que não estava sendo negligente ou evasivo, se desviava o olhar quando alguém me encarava. Ficava pensando porque os adultos comparavam aquele comportamento com falta de sinceridade. Foi nessa mesma época que conheci gente realmente baixa e suja, mas que olhava olhos de todo mundo, o que me fez pensar o quão hipócritas eram as pessoas que me criticavam.





Trecho do tirado do livro " Olhe nos meus olhos"

Nenhum comentário:

Postar um comentário